Dossier

Idosos de Moscavide recusam a solidão

Mais de metade da população de Moscavide é idosa. E com o avançar das rugas vêm outros problemas, principalmente os que estão escondidos como a solidão e a tristeza. Para combater o isolamento social, nasceu o Centro de Dia Social e Comunitário de Moscavide.

Aos 80 anos, Ester Gouveia, não se queixa das dores que sente nas pernas e nas costas. Antes prefere falar do almoço que come “às vezes” no Centro de Dia. É “bom e farto”, diz. “Como aqui e ainda levo para casa”. Infelizmente nos últimos dias, tem faltado. As pernas já não são o que eram e insistem em não querer andar, por isso e porque não quer dar trabalho ao pedir que lhe levem o tabuleiro à mesa. “Tenho que pedir às meninas que mo levem à mesa, mas elas são muito simpáticas e a comida é muito boa, o convívio é maravilhoso”, não se cansa de dizer. É que para quem está sozinha no mundo aos 80 anos, toda a companhia é bem vinda.

No Centro de Dia Social e Comunitário de Moscavide, os cerca de mil utentes já se tornaram numa grande família. As cozinheiras tornam-se em amigas e as vizinhas de mesa em confidentes de memórias que já se pensava estarem esquecidas. Para além de aconchegar o estômago, aquece-se a alma. Os 3,75 euros que paga pela refeição diária não lhe custam a dar. Maria de Lurdes Soares, 80 anos, considera o saldo bastante positivo, se for a pesar na balança o que leva para casa. Momentos de companhia e de convívio que não têm preço.

Hoje o almoço é esparguete à bolonhesa, porque ontem foi peixe. Aquela é a sua segunda casa e o trato já é familiar e a afectividade visível. “Não podiam ter escolhido melhor, a Dona Rosa, a Susana, é tudo pessoal cinco estrelas”. Esta utente optou por almoçar ali porque cozinhar só para um já não tem graça. O seu marido faleceu há três anos, a filha mora em São João da Talha e o Centro de Dia trouxe-lhe o descanso que precisava.

_Há três anos que esta instituição abriu portas, pela mão da Junta de Freguesia de Moscavide, consciente dos números: mais de 60 por cento dos moradores tem mais de 65 anos. Face à realidade que um estudo efectuado pela Rede Social de Loures evidenciou, a Junta de Freguesia decidiu agir. “Acima de tudo pretende ser um suporte social para a população idosa. O nosso grande objectivo é contribuir para que os últimos anos de vida dos idosos sejam de qualidade e que se sintam acompanhados”, explica Sofia Henriques, a coordenadora do projecto.

Para além de servir o almoço, a instituição oferece, a preços simbólicos, serviços de saúde. Tem um gabinete médico, um centro de enfermagem, um centro de fisioterapia, que abriu há cerca de três meses, e um gabinete de apoio psicopedagógico. Este último tem ganho mais adeptos ultimamente, apesar de “haver um estigma muito pesado em virem ao psicólogo, estão renitentes em darem o primeiro passo, temos de ser nós a procurá-los. É um trabalho feito aos poucos”, esclarece a responsável. Mas de extrema importância, reconhece.

“Há muitos idosos em processo de luto, em estados depressivos e sozinhos no mundo.” Um dos projectos para breve é criar grupos de ajuda para idosos que enfrentam estes problemas. “Vamos fazer um conjunto de memórias, para que eles falem das suas vivências e se sintam valorizados enquanto pessoas e percebam o contributo que ainda podem dar”, sublinha Sofia Henriques. Uma das carências é a falta de resposta ao nível do apoio domiciliário. Conforme admitiu Sofia Henriques “não conseguimos dar resposta a todas as pessoas acamadas que precisam de apoio domiciliário. Damos apoio a nível alimentar a duas ou três pessoas, seria bom podermos crescer neste sentido.” De sublinhar que há duas instituições na freguesia que prestam este precioso auxílio.

Pés saudáveis por dois euros

Um dos serviços mais procurados na instituição é a pedicure. Pode parecer uma futilidade, mas o objectivo não é o embelezamento dos pés, mas simplesmente cortar as unhas e tratar as calosidades. Se pensarmos bem, não deve ser fácil para um idoso cortar as próprias unhas dos pés. A maioria nem sequer consegue fazê-lo. Nos diabéticos, uma unha encravada pode dar origem a graves problemas.

Por dois euros, têm uma manicure de serviço. “É uma maravilha!”, considera Manuel Carvalho Júnior, 79 anos, utente do Centro há mais de um ano. Sozinho não consegue cortar as unhas e a sua esposa também já não tem faculdades que lho permitam. Na sua opinião, a Junta está a prestar verdadeiro serviço público: ” É bom que alguém se lembre de nós!”

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