Sociedade

Novos e velhos “interagem” no Bairro Padre Cruz

No maior bairro municipal da Península Ibérica, há um equipamento a fervilhar de vida, de projectos e de vivências, que põe os mais novos a jogar, conversar e passear com os mais velhos. E funciona!

Falamos do Projecto Inter-Age da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, uma designação que encerra um trocadilho entre o verbo interagir e a expressão de língua inglesa que sugere a abrangência de várias idades.

Visitámos o Centro Social e Polivalente do Bairro Padre Cruz para espreitar o ambiente do equipamento, conhecemos a equipa e conversámos com Ana Filipa Rodrigues, a directora, enquanto ali ao lado decorria um jogo de dominó e um bingo com jovens e seniores…

Ficámos a perceber que o CSP do Bairro Padre Cruz tem as respostas de creche (do berçário até aos 3 anos de idade), animação socio-educativa (que recebe de momento 25 jovens entre os 10 e os 20 anos de idade), centro de dia (com cerca de 70 utentes, dos 45 aos 97 anos) e apoio à comunidade, que recebe pessoas sinalizadas pela assistente social que se deslocam ao centro para buscar comida, lavar a roupa ou tomar banho.

Também está disponível um espaço de inclusão digital, com vários computadores abertos à comunidade e onde é possível fazer pesquisas, enviar e-mails, submeter a declaração de IRS, enviar um currículo… o que for necessário!

“Tentamos promover ao máximo a intergeracionalidade e temos sempre acções planeadas ao longo do ano, como o Dia dos Avós, o “dia da marcha popular”, em que fazemos uma marcha intergeracional com os meninos e os nossos idosos, a caça aos ovos na Páscoa, com as crianças da creche e os idosos…”, enumera a directora, acrescentando que novos e velhos se conhecem pelo nome, alguns até se tratam por avô, avó, neto, neta…

Outra actividade que cativou o nosso interesse é o grupo de teatro intergeracional, que apresentou uma peça em Junho, baseada em “O Cornudo Imaginário”, de Molière, no Centro Cultural de Carnide. “Foi muito giro porque tínhamos, por exemplo, um casal em que o marido era idoso e uma jovem era a esposa. Tentamos, sempre que possível, fazer acções de convívio, para promover estes laços de respeito mútuo, amizade e confiança”.

O grupo de teatro, que conta com a parceria da Tenda do actor Hélder Gamboa, revelou-se uma autêntica “caixinha de Pandora”, nas palavras da nossa interlocutora, porque “correu lindamente e conseguiu trabalhar as emoções, a postura, o estarmos uns com os outros, o deixar que brinquem connosco. Quebrou muitas barreiras!”.

Feitas as contas, o universo de utentes “fixos” do CSP do Bairro Padre Cruz é de mais de 130 pessoas: 70 no centro de dia, 25 na Animação Socio-Educativa e 38 na creche.

Convívio intergeracional

“O que nós sentimos é que há uma maior tolerância e uma maior compreensão de parte a parte. Inicialmente os jovens não gostavam de jogar ao «Stop», porque eram muito mais rápidos que os idosos. Os idosos também não apreciavam o barulho que os jovens faziam na sala. Neste momento, sentimos que há mais respeito e tolerância entre eles”, revela Ana Filipa Rodrigues.

A responsável conta-nos que, num passeio ao Badoca Safari Park, a equipa notou uma grande entre-ajuda entre as gerações: “O percurso que tínhamos de fazer era tortuoso e os jovens voluntariaram-se, sem ser necessário pedir, a apoiar os idosos nesse trajecto”.

Felizmente, o Inter-Age tem levado até ao Centro Social Polivalente muitas pessoas que o procuram para fazer actividades pontuais. A título de exemplo, a primeira turma de yoga já está completa e inclui muitas pessoas que não frequentam o centro de dia.

No Bairro Padre Cruz desde Maio de 2016, Ana Filipa Rodrigues classifica o trabalho como “muito gratificante”, porque “podemos fazer a diferença e mudar alguma coisa na vida das pessoas, por mínima que seja, todos os dias. Quando ouvimos dizer «Foi tão bom, obrigado por me ter ajudado, era disto que estava a precisar», percebemos que o nosso trabalho faz sentido. Isso é o que faz valer a pena vir trabalhar todos os dias!”.

“Foi tão bom ter vindo para cá”

Pedimos à directora que nos conte uma história ilustrativa da missão do equipamento. Ana Filipa Rodrigues não precisa de pensar muito para nos contar o caso de uma senhora, da qual se lembra muitas vezes, cujo filho não queria que ela ficasse em casa sozinha. “No primeiro dia estava muito sisuda, com o rosto muito fechado. E eu disse-lhe: «Olhe, se não gostar, não há problema, ficamos amigas à mesma. Almoça connosco e vamos pô-la a casa a seguir». Talvez um mês depois, esta senhora veio ter comigo e disse-me: «Sabe? Foi tão bom ter vindo para cá! A comida é muito boa, divirto-me muito, nunca me mexi tanto na vida». Ela faz pilates, fitness, dança, teatro… Passou de estar em casa sozinha e fechada entre quatro paredes a ser uma pessoa activa, que já consegue apanhar o transporte para o centro de dia e descobriu que podia fazer muita coisa que achava que já não era capaz”.

Em jeito de informação aos interessados, a participação nas actividades do CSP do Bairro Padre Cruz é destinada a maiores de 55 anos e gratuita. Basta pedir informações ao balcão ou contactar previamente, preencher um formulário de inscrição… e já está!

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