Reportagem

O cidadão comum faz-se ouvir na Assembleia da República

A convite do próprio movimento cívico, acompanhámos a audição que três deputados de três partidos representados na Assembleia da República concederam aos Vizinhos do Areeiro.

A comitiva, composta por cinco elementos (se descontarmos este jornalista), esteve sempre em superioridade numérica dentro das salas de reunião em que os deputados ouviram a sua voz. Rui Martins, Jorge Oliveira, Ana Paula Araújo e Rodolfo Franco são membros empenhados do Movimento Cívico Vizinhos do Areeiro; José Rodrigues representava a Livraria Barata, dando eco a um dos temas que o grupo tinha como missão apresentar aos partidos. Juntos, representaram na “casa da democracia” cerca de 5000 membros do grupo.

E que temas eram esses? Encontrando um equilíbrio difícil entre dois

extremos igualmente contraproducentes – não perder a oportunidade de chamar a atenção para várias causas e não apresentar muitos temas de uma só vez –, os Vizinhos do Areeiro apresentaram a sua preocupação com os problemas de insegurança na sua freguesia, dadas as condições e os recursos insuficientes da esquadra que a serve; manifestaram preocupação com o desaparecimento das livrarias independentes e a falta de apoio de que padecem; apresentaram uma proposta de autorização do voto postal para doentes acamados no domicílio (só os internados podem usufruir deste direito); e entregaram uma petição em defesa da imprensa regional e local, com várias propostas e exemplos de outros países ou regiões para suscitar debate dentro dos próprios grupos parlamentares.

Rui Martins, membro fundador do grupo, não é um estranho nos corredores do Parlamento, e não é porque tenha alguma vez exercido algum cargo de assessor ou funcionário. É que já levou a cabo esta missão de apresentar problemas e preocupações aos deputados em várias ocasiões, com sucesso variado. Não se julgue que é fácil!

Ao EXPRESSO do Oriente, Rui começa por explicar que “É complicado chegar aos deputados e ainda mais complicado chegar ao Governo. A eficácia é necessariamente reduzida por causa disso mesmo. O máximo que os partidos de oposição podem fazer é uma pergunta em plenário, ou uma recomendação por escrito, como aconteceu no ano passado em relação à esquadra que serve a Freguesia do Areeiro”, um tema de novo trazido à atenção dos eleitos este ano.

Quanto à parte prática, e depois de conseguida a marcação na agenda dos grupos parlamentares, os cidadãos são recebidos por um deputado que é especialista nos temas abordados, acompanhado de um ou dois assessores. No dia da nossa visita, o deputado do PSD Carlos Peixoto fez-se acompanhar por uma assessora; a deputada do PCP Alma Rivera e o deputado do PS Diogo Leão apresentaram-se sozinhos.

Apresentar propostas, suscitar debate

Perguntamos a Rui Martins o que ganham os Vizinhos do Areeiro com este esforço. O responsável identifica duas vantagens principais: a da intermediação – “os partidos podem confrontar o governo com os nossos assuntos” e o da definição da agenda – “colocar na agenda do Parlamento os nossos temas já é, em si, uma vitória, porque falar do tema é o primeiro passo para a sua solução”.

No entanto, não há ilusões: “Não temos qualquer tipo de expectativas em relação ao cumprimento integral das nossas propostas. O que nos move é procurar contribuir para a solução dos problemas que identificamos. Não estamos à espera que todas as propostas que fazemos para o policiamento e as condições das esquadras sejam implementadas, mas é um dever de cidadania”.

Rui Martins vai mais longe e alvitra: “No fundo acho que os deputados apreciam. Eles próprios mencionam na sua agenda pública estes encontros com cidadãos, valorizam esse dever da sua função, muitas vezes publicam fotografias desses contactos. No entanto, não considero que sejam eficazes. Não existe em Portugal ainda essa abertura. A nossa democracia é muito mais de representação do que de participação efectiva. Não é algo que difira muito de partido para partido, é mais ou menos sistémica. Há muitas ferramentas de participação, mas acaba por produzir poucos resultados, mesmo nas consultas públicas. Esta é uma lacuna de parte a parte, que também radica nos cidadãos.

Foi assim que três deputados de três partidos ficaram a conhecer um pouco melhor os problemas de insegurança na Freguesia do Areeiro, marcada por manifesta desadequação dos meios da Esquadra da PSP das Olaias, cuja abrangência territorial se estende do Campo Grande a Xabregas, contando apenas com quatro agentes por turno, segundo informações dos Vizinhos do Areeiro.

Foi assim que ouviram os cidadãos lamentar o abandono das livrarias independentes e a concentração do mercado em grandes grupos que asfixiam os pequenos empresários, perdendo-se elos de comunidade e difusão cultural dinâmicos e úteis.

Foi assim que receberam o pedido especial de alterar a lei do voto postal para incluir os doentes acamados em casa, na plena posse das suas faculdades, actualmente impedidos de votar se não puderem abandonar o domicílio.

E foi assim que se inteiraram de mais de uma dúzia de propostas em defesa da imprensa local e regional, que desempenha um papel importante de reforço da democracia, particularmente ao nível do poder local.

Na data em que finalizámos esta reportagem, os Vizinhos do Areeiro estavam em vias de confirmar um encontro com o Bloco de Esquerda, o CDS-PP e o PAN.

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