Dossier

Mais de seis décadas de artesanato

Laura Paulino, de 74 anos, é a única artesã em todo o distrito de Lisboa e exerce a arte em sua casa. Dedicou grande parte da vida à cestaria em verga e são já várias as participações em feiras e certames, onde tem demonstrado toda a sua mestria. O jornal EXPRESSO do Oriente foi conhecer a realidade de uma profissão que faz parte do passado, do presente e quem sabe do futuro do distrito.
A boa disposição e a simpatia da ‘Avó Laura’, como é mais conhecida no concelho de Loures, escondem uma vida de dificuldades, que estão bem marcadas no rosto e, principalmente, nas mãos. Filha de camponeses, desde cedo que começou nas lides do campo deixando para trás os
estudos. Aos 15 anos foi convidada a trabalhar nas adegas Camilo Alves, em Bucelas, a empalhar garrafões. “Não sabia fazer nada, mas como a
vida do campo era difícil, aprendi tudo em oito dias e continuei a trabalhar lá até me casar e engravidar”, recorda. Assim aprendeu a profissão
que lhe tem servido de sustento há mais de 60 anos. Teve três filhos e outros tantos netos e todos eles aprenderam a trabalhar a verga, no entanto, nenhum deles quis seguir o percurso da ‘Avó Laura’. “Não compensa” desabafa. Em casa, onde é hoje o seu local de trabalho, foi experimentando fazer mais do que empalhar garrafões, começando pelos cabazes, depois pelos cestos e finalmente pelas cadeiras. Mas as 13 operações a que já foi submetida obrigaram-na a afastar-se das suas cestas durante vários anos, porém, o gosto pela arte fê-la voltar. “Tenho sofrido mas vou dando conta do recado, parada é pior”.

“Passagem de conhecimento”
Agora, o que faz essencialmente é dar aulas e participar em exposições mas diz que não compensa porque as pessoas já não dão valor ao trabalho. “O artesanato agora são aquelas bijutarias, colares e pulseiras, tudo comprado nos chineses ou nos ciganos e depois dizem que
foram eles que fizeram. Fico enervada quando ouço dizer isso”, revela inconformada. “Nas minhas peças há a garantia de qualidade e olhe que
muitas vão durar mais anos do que eu”, afirma. Anda por muitos estabelecimentos de ensino que a convidam para dar aulas de cestaria,
entre as quais a Faculdade de Letras, mas nunca aprendeu a ler. Também já deu aulas particulares na sua casa e recorda uma aluna que a surpreendeu. “Normalmente, as pessoas não têm paciência, querem aprender tudo numa hora. Mas aquela jovem, de 11 anos, não
era assim. Dedicava-se afincadamente e produzia peças fantásticas, mesmo só tendo uma mão”. Contudo, nem sempre a vida
corre pelo melhor e às vezes até pensa em desistir de tudo, “porque não me dão valor e já não se vende nada, mal dá para sobreviver”. Mas acaba por voltar atrás na decisão quando se recorda que é a única que se dedica a este trabalho no distrito lisboeta, “fico com pena porque sei que esta arte vai acabar por cair no esquecimento”.

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