Reportagem

Há 100 anos benfiquista

resized_Amílcar de Oliveira (23)Na Freguesia da Penha de França, encontramos uma pessoa muito especial. Chama-se Amílcar de Oliveira e completou no dia 22 de Novembro de 2015 a magnífica idade de 100 anos!

Nasceu numa altura em que a república ainda era uma realidade, antes do salazarismo. Nasceu quando não havia televisão, quando o homem ainda não tinha chegado à lua, quando se combatia a Primeira Grande Guerra… E 100 anos depois, ainda cá está para contar histórias!

Amílcar de Oliveira recebe-nos na sua casa, envergando um casaco e um gorro do Sport Lisboa e Benfica. Mais tarde havemos de percorrer com a vista as paredes do seu quarto, forradas com quadros, troféus e homenagens benfiquistas. E é por aí que começa a nossa conversa.

“Sou do Benfica sim senhor. Pratico ginástica no Benfica há mais de 75 anos!”. Na verdade, o Sr. Amílcar é porventura o mais célebre dos “Madrugadores”, a classe de ginástica N.º 1 do clube, que gosta de enfrentar o frio matinal e começar bem cedo a actividade física, logo pelas 7 horas. De tal maneira que a classe recebeu o seu nome, em jeito de homenagem.

Neste momento está afastado do exercício por indicação médica. “Dei uma queda e fiquei magoado nas costelas, fiquei arrasado…”, conta-nos como quem lamenta mais a consequência que o facto em si. “O meu médico cardiologista nem sabia que eu fazia ginástica, só soube há pouco tempo…”.

Da ginástica ao trabalho, Amílcar fala sobre qualquer tema com uma memória praticamente intacta. “Depois de me reformar ainda trabalhei até aos 81 anos. E vim-me embora porque quis!”. Ouvimos a história de como não deixou que o chefe estivesse com rodeios na hora de o dispensar: “Diga-me o que tem para me dizer rapidamente, porque se não diz hoje… amanhã já não estou cá para trabalhar!”. Ou de como pagava os seus 350 escudos de renda com os 400 escudos de ordenado no antigo Mercado do Poço dos Mouros, na altura em que passou a habitar a casa onde agora vive, na Rua Jacinto Nunes. Os 50 escudos que sobravam entregava-os aos pais para governarem a casa. Pagava a quota de sócio do Benfica com o dinheiro que fazia a vender pacotes de café!

resized_Amílcar de Oliveira (16)Amílcar de Oliveira foi o penúltimo de 13 filhos. Nasceu no centro histórico da Sertã, mas vive na Penha de França desde que se lembra (veio para Lisboa aos 11 anos). E lembra-se de quando nada era o que é hoje: “Lembro-me da Paiva Couceiro quando ela ainda não existia”. Lembra-se dos campos da bola, dos terrenos de terra batida, das hortas, de não haver construção “da Morais Soares para baixo”, além do cemitério, “que sempre lá esteve”. Lembra-se de ver passar “as carroças com o vinho do Poço do Bispo”.

Teve três filhos, dos quais restam dois, uma vez que um deles faleceu ainda novo. Os dois filhos deram-lhe quatro netos, que por sua vez lhe deram quatro bisnetas, entre Portugal e França. Uma das netas é Sofia Costa, que nos mostra a prenda que a família lhe ofereceu por altura dos 100 anos: um livro inteiramente dedicado à colecção de memórias e testemunhos de uma vida. “Amílcar de Oliveira: 100 Anos, Cem Partes”, com edição da Associação Portuguesa de Presencing. Na obra podemos ver recortes de uma vida centenária, com fotografias, dedicatórias, recordações e pensamentos que condensam um século em duas centenas de páginas.

“A minha saúde e a minha idade, devo-as à ginástica”, garante o nosso amigo, já quando nos guia pelos corredores da casa para nos mostrar o quarto e os troféus. “Bendita a hora que comecei a fazer ginástica!”.

Despedimo-nos com uma sensação estranha de termos recebido um curso intensivo de lições de vida. Obrigado, Sr. Amílcar!

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